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Histórias do Mar

Se você encontrar este peixinho pela frente, saiba que ele é um perigo

Jorge de Souza

10/10/2018 04h00

No mês retrasado, a foto de um vídeo submarino, supostamente feito por um mergulhador, fez soar o alerta na sede do Parque Nacional Marinho de Abrolhos, no sul da Bahia. A imagem mostrava um lindo peixinho nadando entre os corais da região.

Seria apenas um belo registro da vida submarina não fosse o tal peixinho um terrível invasor e o ser marinho que os ambientalistas mais temem que chegue ao mar brasileiro. E, aquele exemplar, poderia significar que isso já está acontecendo.

O ser em questão é o temido – mas lindo – peixe-leão, também conhecido como peixe-escorpião, porque seu leque de barbatanas esconde poderosíssimos espinhos venenosos.

Mas esse não é o risco que o peixe-leão oferece ao meio ambiente do mar brasileiro. O verdadeiro problema é que, onde ele surge, a vida marinha como um todo corre perigo. Sobretudo onde ele não tem predadores naturais, como é o caso do mar brasileiro. Daí o terror que aquela foto causou nos pesquisadores baianos.

"Ainda não temos certeza se a imagem era autêntica ou fruto de uma brincadeira de mau gosto, mas estamos convocando as pessoas que estavam no barco para prestar esclarecimentos", diz o diretor do Parque Marinho de Abrolhos, Fernando Repinaldo. "Passamos uma semana mergulhando no mesmo local e não vimos nenhum peixe-leão", explica. "Mas com este peixe não se brinca", alerta.

"Ele é como um felino dentro de um galinheiro", diz o pesquisador brasileiro Luiz Rocha, que já participou de pesquisas sobre a invasão da espécie nos Estados Unidos.

Um único peixe-leão é capaz de devorar, em pouco mais de um mês, 80% de todos os organismos vivos de uma área de recifes de coral com cerca de 10.000 m2. E os corais são a essência do mar que banha o parque de Abrolhos.

O problema já ganhou dimensões de epidemia no Caribe e na costa leste americana, onde os peixes-leões se tornaram verdadeiras pragas e sua captura vem sendo amplamente estimulada, inclusive como comida, já que, embora tenha espinhos venenosos, sua carne é branca, macia e não tem toxinas.

"Uma das alternativas para conter a superpopulação da espécie é fazer o mesmo que eles fazem com os outros seres marinhos: comê-los", diz um mergulhador da ilha de Curaçao, no Caribe, onde já se promovem torneios de captura de peixes-leões.

Estima-se que eles tenham chegado ali misturados a água dos tanques de lastro dos navios ou como simples descartes de donos de aquários, já que, por sua beleza, o peixe-leão é uma espécie bastante popular entre os aquaristas – inclusive no Brasil.

Agora, o temor é que os peixes-leões estejam migrando do Caribe para o litoral brasileiro, em busca de alimento. Até porque este não foi o primeiro encontro de um exemplar da espécie no mar do Brasil.

Quatro anos atrás, dois exemplares foram vistos e capturados no litoral de Arraial do Cabo, no litoral do Rio de Janeiro. Desde então, os pesquisadores estão em estado de alerta.

"O que deveriam fazer é parar de vender este bicho vivo", diz a diretora para a América Latina do Programa Global de Espécies Invasoras, a brasileira Sílvia Ziller. "Se o peixe-leão não estivesse nos aquários das casas, diminuiriam os riscos de ele ir parar, acidentalmente ou não, no mar", explica.

Exagero? Talvez não. No Caribe, pode ter começado assim. Com um único exemplar solto na natureza, no lugar errado.

Como um peixinho tão bonito, que não passa dos 30 centímetros de comprimento, pode ser tão perigoso? A resposta está em todos os mares por onde ele já passou, cujas consequências podem ser conferidas clicando aqui.

E tomara que isso não esteja acontecendo também no litoral brasileiro. Por isso, se ver um gracioso exemplar de peixe-leão nadando no mar, faça um favor a natureza: acabe com ele.

Sobre o autor

Jorge de Souza é jornalista há quase 40 anos. Ex-editor da revista “Náutica” e criador, entre outras, das revistas “Caminhos da Terra”, “Viagem e Turismo” e “Viaje Mais”. Autor dos livros “O Mundo É Um Barato” e “100 Lugares que Você Precisa Visitar Antes de Dizer que Conhece o Brasil”. Criou o site www.historiasdomar.com, que publica novas histórias náuticas verídicas todos os dias, fruto de intensas pesquisas -- que deram origem a seu terceiro livro, também chamado "Histórias do Mar - 200 casos verídicos de façanhas, dramas, aventuras e odisseias nos oceanos", lançado em abril de 2019.

Sobre o blog

Façanhas, aventuras, dramas e odisseias nos rios, lagos, mares e oceanos do planeta, em todos os tempos.