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Histórias do Mar

Festança reúne 95 barcos e 750 pessoas a caminho de Fernando de Noronha

Jorge de Souza

13/10/2019 12h04

Está previsto para o início da noite de hoje, segunda-feira, a chegada do último dos 95 barcos que participaram da maior regata oceânica do Brasil, a Refeno, que partiu no início da tarde de sábado de Recife, rumo ao paraíso de Fernando de Noronha.

O primeiro a chegar, no início da noite de ontem, foi o barco pernambucano Patoruzú, que completou o percurso de mais de 500 quilômetros em quase 28 horas. Em seguida, os demais barcos começaram a chegar à ilha, num ritmo que varou toda a madrugada – e que continuará ao longo do dia de hoje.

Por isso, só na quarta-feira (dia 16) haverá a festa de encerramento da regata mais desejada do Brasil na própria ilha de Fernando de Noronha.

De lá, dias depois, os mesmos barcos partirão para uma espécie de passeio de volta ao continente, em direção a Cabedelo, na Paraíba, onde mais uma festa está prevista.

Grandes festas e total desprezo pelo que diz o calendário – se sábado, domingo ou segunda-feira -, fazem parte da rotina desta competição, que já foi disputada 31 vezes com mais gente a cada edição.

Este ano, foram mais de 750 pessoas, a maioria nem um pouco preocupada em vencer a competição ou terminar bem classificada – apenas em fazer parte da festa, e, de quebra, visitar Fernando de Noronha de um jeito bem original, navegando em bonitos veleiros no mar.

"Sempre quis conhecer Noronha e andar num veleiro", diz o advogado paulista Eudes Pinheiro, de 57 anos, e nenhuma experiência em barcos. "Daí, quando um amigo me falou dessa regata e disse que eu poderia participar, comprando uma vaga, topei na hora", explicou, feliz da vida, enquanto tomava uma caipirinha e saboreava quitutes nordestinos em plena tarde de quinta-feira, no bar do Cabanga Iate Clube, de Recife, organizador da competição e da maratona de festas e comemorações que antecedem e sucedem a famosa regata.

A festança começou uma semana antes, com uma megafeijoada. E continuou durante toda a semana, com shows ao vivo de bandas, almoços, jantares, encontros de velejadores, palestras com gente do meio (a do navegador Amyr Klink foi particularmente concorrida) e muito, muito chope de graça, para todos os participantes.

"A Heineken só patrocina duas regatas em todo o mundo: uma no Caribe, para mais de 500 barcos, e a nossa, aqui em Recife", diz, orgulhoso, o Comodoro do clube, o pernambucano Delmiro Gouveia. "Isso mostra a relevância da Refeno e a capacidade dessa regata de ser uma gigantesca festa", explica Delmiro, que estima custo total do evento em bem mais de meio milhão de reais. "Nossa regata é grande em todos os aspectos", completa.

R$ 6 mil por uma vaga

Entre os velejadores, a fama da Refeno, cujo estranho nome é uma mistura dos nomes dos locais de onde a regata parte (Recife) e chega (Noronha), sempre existiu, desde 1986, quando foi criada a competição.

Tanto que uma parte deles saiu navegando de São Paulo e do Rio de Janeiro ainda no início de julho, para estar em Recife a tempo da largada.

Mas a novidade é que, agora, muita gente que não é do meio náutico, nem sequer tem barco, vem participando da regata, graças a oferta de vagas nos veleiros, mediante pagamento.

"Paguei R$ 6 mil por uma vaga, mas não me arrependo", diz outro advogado de São Paulo. "Só esta semana de festas no clube já valeu o dinheiro. E olha que ainda nem chegamos a Noronha, onde, dizem, o visual da ilha visto do mar é de matar".

"É verdade", confirma a experiente velejadora pernambucana Karina Hutzler, que já participou 13 vezes desta regata. "Já cheguei a navegar propositalmente devagar, embora fosse uma competição, só para chegar em Noronha durante o dia e ver a ilha surgindo lá longe, aos poucos", diz. "A visão da ilha surgindo na linha do horizonte no mar é emocionante".

"Não há prêmios para os vencedores", explica o organizador da regata. "O prêmio é chegar em Fernando de Noronha e curtir aquela ilha maravilhosa", diz Delmiro Gouveia. "Portanto, todos saem ganhando", brinca.

Até bebê e idoso

A facilidade de poder comprar vagas nos barcos para participar da regata tem tornado cada vez mais eclético o time de participantes da Refeno, que existe há 31 anos.

Este ano, há tanto um bebê com meses de idade, filho de um casal que mora no próprio barco, quanto um senhor de 84 anos de idade – sem falar em dois cachorros e um gato, que também fazem parte das tripulações dos seus respectivos barcos.

Até o atual ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, que é Almirante da Marinha, está competindo, a bordo de um dos barcos.

"Tem gente que vem para tentar vencer a regata e muitos outros que só querem entrar na festa e chegar à Noronha de barco", diz a velejadora Karina, explicando o sucesso do novo negócio de venda de vagas nos veleiros.

Um deles, está navegando com nada menos que 16 turistas pagantes e em ritmo de passeio. Por isso, só deverá chegar à ilha no final do dia de hoje. "Quanto mais demorar melhor, porque daí a gente curte também a travessia", resume um dos tripulantes, também de São Paulo, que, no total, diz que irá gastar "uns R$ 10 mil" na viagem.

"Mas o ponto alto vai ser mesmo quando a gente chegar em Noronha e desembarcar para conhecer a ilha", vibra. "E olha que, até agora, tem sido só alegria. Ano que vem, pode apostar, eu volto".

Fotos: Tsuey Ian/Divulgação

Sobre o autor

Jorge de Souza é jornalista há quase 40 anos. Ex-editor da revista “Náutica” e criador, entre outras, das revistas “Caminhos da Terra”, “Viagem e Turismo” e “Viaje Mais”. Autor dos livros “O Mundo É Um Barato” e “100 Lugares que Você Precisa Visitar Antes de Dizer que Conhece o Brasil”. Criou o site www.historiasdomar.com, que publica novas histórias náuticas verídicas todos os dias, fruto de intensas pesquisas -- que deram origem a seu terceiro livro, também chamado "Histórias do Mar - 200 casos verídicos de façanhas, dramas, aventuras e odisseias nos oceanos", lançado em abril de 2019.

Sobre o blog

Façanhas, aventuras, dramas e odisseias nos rios, lagos, mares e oceanos do planeta, em todos os tempos.