“Achei que não daria”, diz a brasileira que surfou a onda que virou recorde
Na semana passada, uma brasileira entrou para o Livro dos Recordes por um motivo impressionante: surfou a maior onda já enfrentada por uma mulher, depois de entrar nela remando, o que faz muita diferença.
A façanha aconteceu num lendário ponto de surf na ilha de Maui, no Havaí, conhecido como "Jaws" ("mandíbulas", em inglês), numa alusão à violência das ondas, ali similares a mordidas de tubarões.
A extraordinária parede de água alcançou 13 metros de altura, o equivalente a um prédio de quatro andares.
"Achei que não daria, mas, naquele dia, a minha autoconfiança foi maior que o receio", recorda a paulista Andrea Moller, autora da façanha.
O feito rendeu a Andrea não apenas a entrada no Livro dos Recordes como, também, o prêmio de surfista do ano na categoria Ondas Grandes com remada, uma espécie de Oscar para os surfistas das maiores ondas do planeta.
Ela estabeleceu o recorde
Não foi, porém, a primeira vez que ela ganhou este prêmio, que também foi vencido pela brasileira Maya Gabeira, em outra modalidade.
Em 2016, Andrea também foi premiada como a melhor surfista de ondas grandes do ano, por sua performance geral. "Mas, agora, foi ainda melhor, porque oficializou o recorde", diz Andrea.
"Na verdade, eu não bati o recorde. Eu fiz o recorde, porque, daqui em diante, será ele que servirá de referência para quem quiser tentar quebrá-lo", completa, entusiasmada.
39 anos e mãe
Uma jovem menina maluquinha que arrisca a própria vida para ficar famosa? Pois Andrea Moller não é nada disso.
Ela é o oposto do que se possa imaginar de uma surfista fissurada por ondas com muitas vezes a sua altura. É casada, tem 39 anos, trabalha como paramédica na ilha de Maui, onde vive com o marido, e tem uma filha, de 16 anos – que não é surfista.
"A surfista da casa é a minha mãe", diz a filha Keala, cujo o máximo que pratica na água são pacatas partidas de polo aquático, e que diz ficar "um pouco nervosa" quando vê a mãe despencar do alto de muralhas d'água capazes de trucidar surfistas desafortunados.
"Ela sempre foi auto-suficiente e destemida", diz o irmão Marcos Moller, que, junto com o pais, administra uma marina em Ilhabela, no litoral de São Paulo, onde Andrea foi criada.
"Ela é uma 'casca-grossa', como dizem os surfistas", resume o irmão da grande atleta, que, por aqui, poucos conhecem.
"No Havaí, todos os grandes surfistas ajoelham para ela passar. Lá, ela é uma personalidade. Mas, aqui no Brasil, poucos já ouviram falar de Andrea Moler, até porque ela não faz questão de ser famosa. Ela surfa ondas enormes apenas porque gosta", diz o irmão da recordista.
Andrea concorda. Diz que, para ela, nada se compara à sensação que sente quando começa a remar na direção de uma onda monstruosa.
"Quando entro na onda, nada mais importa. A adrenalina jorra no corpo e o foco passa a ser totalmente na manobra. A cabeça limpa e não penso em mais nada. Só em não cair e não ser engolido por ela", diz Andrea.
"Já até tentei mudar de modalidade, me dedicar a ondas menores, mas, para mim, não é a mesma coisa", diz Andrea, que nada tem do esteriótipo padrão dos surfistas – é responsável, não usa muitas gírias e ganha a vida salvando vidas em acidentes de trânsito na ilha de Maui.
"Surfar ondas grandes é, para mim, um estilo de vida e um exercício de autoconfiança e responsabilidade. Só entro numa onda dessas quando tenho certeza de que poderei domá-la", diz a surfista, que, no entanto, já sofreu alguns acidentes.
No pior deles, também no Havaí, onde vive há 21 anos, teve que passar por cirurgias e ficou três meses de cama, após deslocar toda a musculatura da bacia, ao cair numa grande onda. "Minha filha ficou cuidando de mim, em casa", diz Andrea, que começou a surfar esse tipo de onda justamente quando a filha havia acabado de nascer.
Pioneira entre as mulheres
Ela foi, também, a primeira mulher do mundo a se especializar em surfar ondas gigantescas, o que acabou por levar à criação da própria modalidade feminina no Campeonato Mundial do gênero, chamado de "XXL" (sigla para tamanho "extra extra-large", em inglês), numa referência ao tamanho descomunal das ondas no qual é disputado.
"Fui pioneira, mas fiz isso apenas porque gostava de surfar as ondas que só os melhores homens conseguiam. Não tinha intenção de criar nada", diz Andrea.
"Já que a categoria feminina foi criada, agora luto para que as meninas ganhem os mesmos prêmios em dinheiro que os meninos, já que nós surfamos as mesmas ondas que eles", completa.
Categoria mais difícil
Dentro do surf em ondas gigantes, a modalidade na qual Andrea se tornou especialista é justamente a mais difícil de todas: a "paddle inn", ou "entrada com remada", quando o surfista usa apenas a força dos próprios braços para se posicionar diante da onda. Na outra modalidade, um jet ski coloca o surfista na melhor posição, o que facilita a vida de quem está na prancha.
"O paddle inn era considerado loucura nesse tipo de onda, mas, para mim, ele apenas exige mais técnica", diz a brasileira, que hoje é venerada como uma das maiores surfistas da história do Havaí – reconhecimento confirmado com o prêmio pelo recorde na semana passada.
Ondas ainda mais loucas
Ondas gigantescas são fenômenos relativamente comuns no Havaí, a Meca mundial do surf. Mas também acontecem em outros lugares do planeta. Inclusive no mar aberto, longe de qualquer praia.
Batizadas de "Freak Waves", ou "Ondas Loucas", porque surgem de repente e sem nenhum motivo aparente, as ondas gigantes no meio do oceano já produziram muitos mistérios e tragédias.
Mas, para a destemida brasileira Andrea, quanto maior for a muralha d'água à sua frente, maior será a sua diversão no mar.
Fotos: Fred Pompermayer, Divulgação WSL e Arquivo Pessoal
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