Aposentado vai tentar, de novo, chegar à Venezuela de canoa
Nem mesmo um dramático naufrágio, que o fez perder o barco e quase a própria vida, foi forte o bastante para fazer o mineiro, radicado no Espírito Santo, Jackson Rodrigues da Silva, um aposentado de 61 anos, desistir do seu sonho: navegar de Vitória à nascente do rio Orinoco, na Amazônia venezuelana, com uma espécie de canoa a vela construída por ele mesmo.
Quatro meses atrás, ele tentou, pela primeira vez. Mas não passou do litoral sul da Bahia, a pouco mais de 300 quilômetros da capital capixaba, de onde havia partido.
Ali, uma tempestade enquanto estava ancorado sobre uma bancada de corais, a cerca de dez quilômetros da costa, demoliu o seu frágil barco e ele só escapou com vida porque havia uma traineira de pesca ali por perto, que lhe deu abrigo.
Em minutos, o barco de Jackson, que também lhe servia de casa, porque era onde ele morava, mesmo só cabendo na minúscula cabine se estivesse praticamente deitado, virou um monte de tábuas soltas no mar.
"Nem quis olhar", recorda. "Fiquei só com a roupa do corpo".
Mesmo assim, Jackson não desistiu. Voltou de ônibus para Vitória e, já no dia seguinte, começou os planos para construir outro barco e tentar, de novo, fazer esta longa e improvável viagem, de quase 5 000 quilômetros, que pretende realizar ao longo de nada menos que oito meses.
"O novo barco será praticamente igual ao que foi destruído e também de madeira. Já até comprei as tábuas, com o dinheiro que os amigos me deram", conta o resiliente Jackson, que, por enquanto, mora de favor no barco de um deles, na praia da Curva da Jurema, em Vitória.
É ali, num puxadinho nos fundos do bar de uma amiga, que ele está construindo seu novo barco, para tentar, uma vez mais, ir do Brasil à Venezuela a bordo de não mais do que uma canoa avantajada. "Até o fim do ano, o novo barco fica pronto", garante. "Depois, é só esperar a temporada dos ventos favoráveis e partir de novo", planeja.
Mas por que um barco tão frágil para uma travessia tão longa? "Porque, com um barco maior, não teria graça nem eu teria dinheiro para construí-lo", explica Jackson, que diz navegar desde os 10 anos de idade e se orgulha de, com o mesmo barco que se despedaçou na primeira tentativa, ter navegado da Bahia à Paraty, onde conheceu até Amyr Klink. "Ele ficou impressionado com o tamanho da cabine do meu barco", recorda, rindo. "Disse que parecia um sarcófago".
Mas Jackson não se importa com os comentários que ouve sobre os seus barcos e sobre a longa viagem que pretende fazer. "Doido é o mínimo que escuto quando digo que vou navegar até a Amazônia com esse barco", diz. "E pode escrever aí que vou mesmo!", garante o persistente aposentado, para muitos apenas um maluco ousado – mas um sujeito tão determinado que pode mesmo ser capaz de fazer algo extraordinário. Como ir com uma canoa caseira do Espírito Santo à Venezuela. Desde que o novo barco aguente. Porque o primeiro…
Mais do que um simples desejo que alimenta desde os tempos em que trabalhou como técnico de manutenção na Amazônia, Jackson explica que a incomum travessia que botou na cabeça que irá fazer e não há quem o faça mudar de ideia é, também, uma homenagem a um dos maiores navegadores da História: o americano Joshua Slocum, que desapareceu no mar no início do século, quando tentava chegar justamente no rio Orinoco, navegando sozinho um barco pouca coisa maior do que a canoa de Jackson.
"Antes disso, o Slocum foi do Paraná aos Estados Unidos com um barquinho que ele mesmo construiu aqui no Brasil, sem ferramenta alguma, levando mulher e dois filhos, numa das maiores façanhas náuticas de todos os tempos", conta Jackson, resumindo a histórica e extraordinária viagem da canoa Liberdade, em 1888, hoje exposta no museu Smithsonian, em Washington, que pode ser conferida clicando aqui.
"Slocum é o meu ídolo", resume o destemido aposentado.
Fotos: Arquivo Pessoal
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